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STJ: MP pode propor Acordo de Não Persecução Penal em ações privadas quando a vítima não toma iniciativa

A decisão do STJ tem impacto significativo na aplicação do ANPP em ações penais privadas, conferindo ao Ministério Público um papel supletivo na oferta do acordo

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial nº 2083823/DF, firmou entendimento de que o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) pode ser proposto pelo Ministério Público em ações penais privadas nos casos em que o querelante não apresenta a proposta no ajuizamento da queixa-crime.

A decisão foi proferida pela Quinta Turma do STJ, que rejeitou o recurso interposto pelo querelante, mantendo o acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que validou a proposta do ANPP feita pelo Ministério Público.

Contexto da decisão

No caso concreto, a queixa-crime foi recebida sem que o querelante tivesse apresentado o ANPP, e o Ministério Público também não havia ofertado o acordo antes da inicial ser recebida. Posteriormente, após o recebimento da queixa, o magistrado determinou a manifestação do Ministério Público quanto ao cabimento de benefícios legais, momento em que foi ofertado o ANPP à querelada.

O querelante contestou a validade do acordo, argumentando que a proposta do Ministério Público após o recebimento da queixa-crime seria indevida e que a legitimidade para a oferta do ANPP em ação penal privada seria exclusiva do querelante.

O STJ, entretanto, afastou essa tese, destacando que a legislação não veda expressamente o cabimento do ANPP em ações penais privadas e que a ampliação dos mecanismos de justiça negociada atende ao interesse público e à pacificação social.

Fundamentos jurídicos do julgamento

A decisão do STJ foi baseada nos seguintes fundamentos:

  • Cabimento do ANPP em ação penal privada: Não há vedação expressa na legislação para a aplicação do ANPP em crimes de ação penal privada. O STJ entendeu que a justiça penal contemporânea tem avançado no sentido de ampliar os mecanismos de resolução consensual.
  • Princípio da disponibilidade: Diferentemente da ação penal pública, a ação penal privada é regida pelo princípio da disponibilidade, permitindo que o querelante desista da queixa-crime ou conceda perdão ao querelado. Por essa razão, o STJ concluiu que a proposta do ANPP pode ser feita mesmo após o recebimento da queixa.
  • Legitimidade supletiva do Ministério Público: O STJ destacou que o Ministério Público pode atuar supletivamente, na qualidade de custos legis, para garantir a aplicação do ANPP quando o querelante não o propõe sem justificativa razoável.
  • Distinção entre ANPP e transação penal: O Tribunal enfatizou que o ANPP não pode ser equiparado à transação penal, que exige a anuência do querelante, pois são institutos distintos.

Impactos da decisão

A decisão do STJ tem impacto significativo na aplicação do ANPP em ações penais privadas, conferindo ao Ministério Público um papel supletivo na oferta do acordo. Na prática, isso impede que o querelante utilize a ação penal como meio de retaliação ou vingança pessoal, reforçando o caráter público da persecução penal.

Além disso, o entendimento do STJ reforça a segurança jurídica ao estabelecer que o ANPP pode ser ofertado pelo Ministério Público mesmo após o recebimento da queixa-crime, desde que presentes os requisitos legais e constatada a inércia do querelante.

Legislação de referência

Código de Processo Penal – CPP

Art. 28-A. Não sendo o caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:
I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;
II – renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;
III – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), em local a ser indicado pelo juízo da execução;
IV – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45, § 1º, do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); ou
V – cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

Art. 45. O Ministério Público velará pela regularidade da aplicação da lei e promoverá a responsabilidade dos que a infringirem. Nos casos de ação penal privada, exercerá as funções de custos legis, podendo intervir nas hipóteses em que houver interesse público ou abuso de direito por parte do querelante.

Art. 51. O perdão concedido, expressa ou tacitamente, pelo querelante a qualquer dos querelados a todos se estenderá, sem necessidade de aceitação, salvo se o querelado tiver declarado que não o aceita.

Processo relacionado: Recurso Especial nº 2083823/DF

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