A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o herdeiro de um imóvel não é responsável pelo pagamento de multa administrativa decorrente de infração ambiental cometida pelo falecido, a menos que tenha contribuído diretamente para a violação das normas ambientais. A decisão negou provimento ao recurso especial interposto pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que pretendia manter a aplicação de multa por desmatamento contra o atual proprietário de uma fazenda herdada.
Multa não pode ser transferida a herdeiro
No caso, o Ibama alegou que o dever de recuperação da área degradada e o pagamento da multa seriam obrigações vinculadas ao imóvel (obrigação propter rem), devendo ser cumpridas pelo atual proprietário, ainda que este não tenha causado o dano ambiental. Contudo, o STJ entendeu que, embora a obrigação de recuperação ambiental seja de natureza propter rem, a penalidade administrativa não pode ser imposta ao herdeiro, salvo se houver comprovação de sua ação ou omissão no desmatamento.
Natureza das obrigações ambientais
O relator do recurso, ministro Paulo Sérgio Domingues, destacou que as obrigações ambientais, conforme estabelecido na Súmula 623 do STJ e no Tema 1.204 dos recursos repetitivos, possuem natureza propter rem, o que implica que o atual proprietário é responsável pela recuperação da área degradada, mesmo que não tenha causado o dano. Essa responsabilidade está prevista em dispositivos da Lei 6.938/1981 e da Lei 12.651/2012, que tratam da reparação de danos ambientais e da responsabilidade civil ambiental.
No entanto, o ministro ressaltou que as multas administrativas previstas no Decreto 6.514/2008 são de natureza sancionatória e não podem ser automaticamente transferidas ao herdeiro, uma vez que dependem da conduta do transgressor. Para que a multa fosse aplicada ao herdeiro, seria necessário comprovar que ele teve algum envolvimento ou culpa na infração.
Penalidades administrativas não seguem a lógica da responsabilidade civil
O ministro Paulo Sérgio Domingues ressaltou que, diferentemente da responsabilidade civil, que objetiva a reparação do dano, as sanções administrativas exigem a comprovação de culpa e de um nexo causal entre a conduta do infrator e o dano causado. No caso, o auto de infração foi lavrado após o falecimento do autor da herança, tornando inviável a responsabilização do herdeiro.
A decisão também mencionou a Orientação Jurídica Normativa 18/2010/PFE/Ibama, que determina a extinção da punição quando o autuado falece antes do trânsito em julgado da decisão administrativa. Com base nesse entendimento, o STJ concluiu que a multa administrativa não poderia ser repassada ao herdeiro.
Questão jurídica envolvida
O caso envolve a distinção entre obrigações ambientais de natureza propter rem e sanções administrativas. O STJ reforçou que, enquanto o dever de recuperar a área degradada pode ser transferido ao novo proprietário, as multas administrativas são de natureza pessoal e exigem a demonstração de culpabilidade, não podendo ser imputadas automaticamente ao herdeiro.
Legislação de referência
- Lei 6.938/1981, artigo 3º, inciso IV, e artigo 14, parágrafo 1º: Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e a responsabilidade civil por danos ambientais.
- Lei 12.651/2012, artigo 2º, parágrafo 2º: Define as responsabilidades relacionadas à preservação ambiental.
- Constituição Federal de 1988, artigo 225, parágrafo 3º: Estabelece a responsabilidade penal e administrativa por condutas lesivas ao meio ambiente.
Processo relacionado: REsp 1823083