A 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) decidiu que a União não pode ser responsabilizada por prejuízos decorrentes de atos de corrupção praticados por ex-diretores da Petrobras. A decisão acolheu os argumentos da Advocacia-Geral da União (AGU) e afastou a possibilidade de condenação do ente federal a um pagamento estimado em R$ 166 bilhões.
Contexto da disputa societária e alegações dos acionistas
A demanda foi movida por acionistas minoritários da Petrobras, que argumentavam que a União deveria ressarcir a companhia pelas perdas decorrentes de escândalos de corrupção investigados na Operação Lava-Jato. A base da argumentação foi o artigo 58 do Estatuto Social da Petrobras, que prevê arbitragem como meio de resolução de controvérsias entre a companhia, acionistas e administradores.
Contudo, segundo os procuradores da AGU, essa cláusula não poderia vincular a União, especialmente porque, à época da inclusão da norma estatutária em 2002, o ente público não possuía autorização legal para participar de arbitragens de forma ampla — o que só se tornou possível em 2015.
Questão jurídica envolvida
A principal questão jurídica envolvida foi a aplicabilidade da cláusula compromissória de arbitragem à União. A AGU demonstrou que a cláusula estatutária se limita a conflitos societários internos da Petrobras e não se estende à responsabilização do Estado por atos ilícitos de seus ex-administradores. Com isso, o TRF2 concluiu que inexiste relação jurídica que justifique a inclusão da União no procedimento arbitral.
A decisão também reconheceu que obrigações assumidas pela Petrobras em seu estatuto não se transferem automaticamente à União, afastando a tese de responsabilidade subsidiária estatal.
Fundamentos jurídicos da decisão
A decisão do TRF2 foi fundamentada nos princípios constitucionais que regem a atuação da Administração Pública, especialmente no tocante aos limites da arbitragem envolvendo entes públicos. A Turma também alinhou seu entendimento a precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), que já haviam reconhecido a inaplicabilidade da arbitragem à União em casos semelhantes.
Impactos práticos e repercussão
Com o resultado unânime, a expectativa da AGU é de que a tese jurídica consolidada no TRF2 seja replicada em instâncias superiores, caso haja interposição de recurso. A decisão representa um marco importante na delimitação dos limites da arbitragem envolvendo a Administração Pública e resguarda os cofres públicos de um passivo de grande vulto, além de reforçar a segurança jurídica nas relações entre o setor público e privado.
Legislação de referência
Constituição Federal
Art. 15, III – É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: (…) III – condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos.
Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015)
Art. 1º – O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.
Estatuto Social da Petrobras (2002)
Art. 58 – Deverão ser resolvidas por meio da arbitragem as disputas ou controvérsias que envolvam a companhia, seus acionistas, os administradores e conselheiros fiscais.
Processo relacionado: 0230623-98.2017.4.02.5101/RJ