A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não é possível aplicar a agravante genérica prevista no art. 61, II, “f”, do Código Penal ao crime de descumprimento de medida protetiva de urgência, tipificado no art. 24-A da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). O entendimento firmado é o de que essa combinação configura bis in idem, uma vez que o contexto de violência doméstica contra a mulher já é elemento constitutivo do tipo penal.
Histórico da decisão
O recurso foi interposto pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios contra acórdão do TJDFT, que havia afastado a agravante por entender que haveria duplicidade punitiva. O STJ manteve a decisão de origem, consolidando a tese de que, por já considerar a violência doméstica como elemento do tipo penal, o art. 24-A não admite a incidência cumulativa da agravante do art. 61, II, “f”, do Código Penal.
Fundamentos jurídicos do julgamento
A decisão destacou que o Tema 1.197/STJ, que afasta o bis in idem na aplicação da agravante em crimes da Lei Maria da Penha, não se aplica ao art. 24-A, pois diz respeito a delitos como o de lesão corporal (art. 129, § 9º, do CP), cujos elementos típicos não exigem, necessariamente, a violência de gênero.
O colegiado concluiu que, no caso do art. 24-A, a violência doméstica é pressuposto do crime, de modo que a aplicação da agravante representaria valoração dupla do mesmo fato, o que contraria os princípios da especialidade, proporcionalidade e da vedação ao bis in idem.
Impactos práticos da decisão
A tese firmada delimita a inaplicabilidade da agravante genérica quando o crime cometido já tem como base a violência doméstica. Isso deve impactar a forma como os juízos de primeiro grau conduzem a dosimetria da pena em crimes tipificados na Lei Maria da Penha, especialmente no que se refere ao art. 24-A.
A decisão reforça o papel da norma especial como suficiente para estabelecer a reprimenda penal, impedindo a superposição de sanções por um mesmo fundamento fático e normativo.
Legislação de referência
Código Penal
Art. 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:
II – ter o agente cometido o crime:
f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica.
Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha)
Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei 13.641/2018)
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Redação dada pela Lei 14.994/2024).
Processo relacionado: REsp 2.182.733-DF