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STJ reconhece direito à inclusão de gênero neutro em certidão de nascimento

Decisão do STJ reafirma a dignidade da pessoa humana ao permitir a inclusão de gênero neutro no registro civil, mesmo sem previsão legal expressa

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por decisão da Terceira Turma, reconheceu a possibilidade de retificação de registro civil para inclusão de gênero neutro em certidão de nascimento. A relatoria foi da Ministra Nancy Andrighi, que destacou o direito ao livre desenvolvimento da personalidade e à autodeterminação de gênero como fundamentos centrais da decisão.

Contexto e histórico da decisão

A ação teve início com pedido de uma pessoa registrada com o gênero feminino ao nascer. Após passar por transição de gênero e alterar o registro para masculino, a requerente informou não se identificar nem com o gênero masculino nem com o feminino, reivindicando o reconhecimento da identidade não-binária. O pedido foi negado nas instâncias ordinárias sob argumento de que o ordenamento jurídico brasileiro ainda não reconhece expressamente o gênero neutro.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a sentença de improcedência, alegando risco de insegurança jurídica e ausência de respaldo legal. Contudo, ao julgar o recurso especial, o STJ reformou a decisão, autorizando a inclusão do gênero neutro no registro civil da parte requerente.

Fundamentos jurídicos do julgamento

A decisão foi fundamentada no art. 12 do Código Civil, que trata da proteção da personalidade, e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. A Ministra relatora ressaltou que o direito à identidade de gênero deve ser compreendido como um desdobramento dos direitos da personalidade e da autonomia privada.

O STJ observou que, embora a legislação brasileira não tenha previsão expressa para o gênero neutro, a ausência normativa não pode excluir da tutela jurídica os sujeitos que não se identificam com o modelo binário de gênero. Assim, aplicou-se o art. 4º da LINDB e o art. 140 do CPC, reforçando que lacunas legislativas não suprimem direitos existenciais.

Impactos práticos da decisão

A decisão abre precedente relevante para que pessoas não-binárias possam requerer a retificação de seus registros civis, incluindo a identificação de gênero de forma compatível com sua identidade autopercebida, ainda que o gênero indicado seja “não especificado”, “neutro” ou “agênero”.

O julgado reconhece que não há prejuízo jurídico ou social na adoção de gênero neutro e que essa medida não compromete a segurança jurídica, mas promove inclusão e respeito à diversidade. Também foram mencionadas experiências de outros países que reconhecem juridicamente o terceiro gênero.

Legislação de referência

Art. 12 do Código Civil
“Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.”

Art. 4º da LINDB
“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”

Art. 140 do CPC
“O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico.”

Processo relacionado: Recurso Especial 2135967/SP

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