O Procon-MG, órgão vinculado ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), aplicou uma multa de R$ 11 milhões à Netflix Entretenimento Brasil LTDA por cláusulas abusivas no contrato de prestação de serviços e nos termos de privacidade. A penalidade foi imposta devido a práticas de publicidade enganosa, falta de informação adequada e exigência de vantagem excessiva.
Cláusulas abusivas e privacidade
A decisão administrativa identificou cláusulas contratuais que isentam a Netflix de responsabilidade em relação ao consumidor, contrariando o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que impõe o dever de reparação por parte dos fornecedores em caso de infrações. Os termos de privacidade da Netflix também foram considerados abusivos, pois preveem a divulgação ilimitada dos dados do consumidor sem a sua anuência.
Desequilíbrio contratual
Segundo o promotor de Justiça Fernando Abreu, essa prática é ainda mais problemática porque o consumidor não pode solicitar o fim da cessão dos seus dados, evidenciando o desequilíbrio contratual e prejudicando o livre exercício dos direitos da personalidade.
Negativa ao Termo de Ajustamento de Conduta
Em 2023, o Procon-MG realizou uma audiência com a Netflix para discutir as cláusulas contratuais e os termos de privacidade. Foi proposto um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para resolver as questões, mas a empresa não aceitou o acordo, levando à aplicação da multa.
Mudança no contrato de prestação de serviço
Em maio de 2023, a Netflix informou aos assinantes sobre a cobrança de taxa por ponto adicional, justificando que os serviços são de uso pessoal e intransferível. No entanto, a decisão administrativa do Procon-MG argumenta que a definição de residência utilizada pela empresa é ilegal e contraria o Código Civil, que permite que uma pessoa tenha múltiplas residências.
Redefinição de residência
A decisão destaca que a Netflix criou o conceito de “Residência Netflix” em seus termos de uso, restringindo o compartilhamento de contas apenas a pessoas que moram na mesma residência e utilizam a mesma conexão de internet. Segundo Fernando Abreu, essa definição é imprópria e desconsidera as modernas compreensões de família, além de promover uma redefinição restritiva do termo residência em prejuízo ao consumidor.
Questão jurídica envolvida
A decisão do Procon-MG baseia-se na interpretação do Código de Defesa do Consumidor, especialmente nos artigos 6º (inciso III), 20, e 51 (incisos IV e X), que tratam do direito à informação, da responsabilidade por vícios de produtos e serviços, e das cláusulas abusivas. A medida também envolve o artigo 421 do Código Civil, que assegura a liberdade contratual limitada pela função social do contrato.
Legislação de referência
Código de Defesa do Consumidor (CDC):
- Art. 6º, inciso III: “São direitos básicos do consumidor: […] III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.”
- Art. 20: “O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir a reexecução dos serviços, a restituição da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço.”
- Art. 51, inciso IV: “São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: […] IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.”
Código Civil:
- Art. 421: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.”